domingo, janeiro 16, 2011

Auto-Conhecimento vs Liderança


“Liderar é orientar a criação de um mundo ao qual as pessoas queiram pertencer”.

“Se houver um cego guiando outro cego, chegarão a algum lugar?”.

A primeira citação, escrita por Robert Dilts, um dos maiores Coachs de liderança empresarial e Programação Neurolinguística da actualidade, define a essência da liderança. Não é possível liderar sem que os outros optem por viajar na mesma.

A liderança possui um paradoxo no seu âmago, não pode ser tomada directamente, pois é um presente que só pode ser dado pelos outros.

A segunda citação, feita há mais de 2000 anos por Jesus Cristo, alerta-nos para o facto de que precisamos de conhecer, ou pelo menos sermos capazes de ver, o caminho para o qual pretendemos dirigir as outras pessoas.

E qual é o mundo que as pessoas querem pertencer?

Para onde é que as pessoas querem caminhar?

O ser humano quer caminhar na direcção dum mundo onde os seus valores sejam mais satisfeitos.

Um tema bastante conhecido actualmente na psicologia organizacional trata da motivação extrínseca e da motivação intrínseca dos empregados de grande empresas.

A motivação extrínseca é quando a motivação se dá devido a uma recompensa externa ao trabalho em si, seja ela dinheiro ou promoção. Essa motivação, apesar de fundamental, tem carácter temporário. Após algum tempo, atingido o patamar financeiro ou o cargo almejado, será necessária a visualização de um novo aumento ou promoção a serem conquistados.

Já a motivação intrínseca tem um carácter um tanto o quanto diferente. É a motivação onde o próprio prazer da realização do trabalho impulsiona para uma nova realização. É quando o estamos a viver nossos valores dentro da função que desempenhamos e da empresa a que pertencemos.

E quais são os valores que impulsionam a pessoa?

Os valores que impulsionam cada pessoa são diferentes. Algumas pessoas são impulsionadas pelo reconhecimento, outras por satisfação pessoal, outras pela possibilidade de exercer a sua criatividade, outras pelo poder e ainda outras pela possibilidade de realizarem uma obra.

Reconhecimento, satisfação pessoal, criatividade, poder, realização, ensino, companheirismo, segurança, transformação, responsabilidade, alegria, são alguns dos valores que impulsionam diferentes pessoas num objectivo.

Então a resposta é fácil. Basta alinharmos o nosso trabalho com os nossos valores pessoais e estaremos constantemente motivados, não é?

Seria, se além das questões práticas não houvesse um pequeno detalhe.

Na maioria das vezes não conhecemos verdadeiramente os nossos valores. Agimos procurando valores que aprendemos que seriam os “mais correctos” a serem procurados. Valores que aprendemos com os nossos pais ou com a nossa sociedade que seriam os mais adequados à nossa vida.

Valores de uma imagem que criamos na esperança de que essa imagem seja a mais aceite e reconhecida pelo mundo externo.

E como, estando cegos de para onde queremos ir, poderemos liderar pessoas na criação dum mundo ao qual queiram pertencer?

Isso não é possível para a verdadeira liderança. O verdadeiro líder deve antes de mais saber para onde quer ir e de seguida colocar-se em marcha nesse caminho. E estando no seu verdadeiro caminho será tão impulsionado pelos seus valores que será possível às pessoas à sua volta perceberem a sua satisfação, o seu carisma natural, a sua congruência entre discurso e prática, e decidirem que esse, também é o mundo ao qual querem pertencer.

Não será preciso convencer ninguém a seguir esse líder. Trata-se de liderança natural, a liderança através do exemplo vivido pelo próprio líder.

Nas mais moderna empresas, voltadas para o desenvolvimento do potencial humano, algumas ferramentas têm sido utilizadas para auxiliar os seus colaboradores a identificarem os seus verdadeiros valores. O processo de coaching, embora mais directamente ligado à orientação para se atingirem metas através da optimização de performance pessoal, passa necessariamente por uma investigação dos verdadeiros valores pessoais do líder e da empresa.

O Coach utiliza técnicas que podem ser emprestadas da psicologia, da Programação Neurolinguística e da análise transacional, entre outras, que auxiliam o líder a conhecer e admitir os seus verdadeiros motivadores naturais e também os seus maiores obstáculos internos, possibilitando o trabalho de potencialização dos seus pontos fortes e minimização dos seus pontos fracos.

Nessa mesma direcção, outra ferramenta que pode ser utilizada nas empresas para identificação dos valores do líder é o Eneagrama. Através do processo de identificação com um dos nove tipos básicos de personalidades, possibilita ao líder o autoconhecimento das suas paixões, fixações, personalidade e preservação.

Ambas as ferramentas podem actuar não somente no desenvolvimento do líder, como também na sua interacção com as outras pessoas. O auto-conhecimento permite ao indivíduo perceber que vê o mundo através de seus próprios pontos de vista, e que são somente os seus e não verdades universais. Essa consciência permite a compreensão das diferenças entre as pessoas e a consequente diminuição do egocentrismo do líder, aumentando em muito a suas capacidades e do seu grupo, para realizarem um verdadeiro trabalho em equipa.

Outro ponto importante é que, embora sejam muitas as ferramentas que podem ser usadas neste processo de auto-conhecimento dos líderes nas organizações, isso não pode ser feito sem um real comprometimento tanto da organização quanto das suas pessoas.

Um processo como esse invariavelmente acarretará em mudanças profundas de paradigmas. Haverá a necessidade de re-alocação de funções, pessoas e estruturas de liderança. Poderá haver um grupo de líderes que se sinta profundamente insatisfeito pela consciência de que não está no lugar certo, trazendo a necessidade da organização de reagir rapidamente na sua re-alocação. E quando as possibilidades não permitirem, poderá haver demissões voluntárias.

Por outro lado, haverá um grupo de líderes consolidados e o consequente desenvolvimento de novos que terão a oportunidade de realizar um trabalho que esteja realmente condizente com os seus valores, gerando em si mesmo e nas pessoas à sua volta todos os tipos de motivação intrínseca e satisfação que isso pode trazer. Os benefícios a médio prazo serão enormes numa relação de ganha-ganha entre a organização e as suas pessoas.

Uma vez que a organização esteja comprometida com esse caminho, será também necessário que as pessoas façam o mesmo.

Elas também terão um árduo trabalho a realizar. Serão necessários coragem, mente e coração abertos para enfrentar muitos desafios. A transformação pessoal só pode ser realizada com a permissão e o esforço da própria pessoa. O auxílio exterior é necessário, porém o próprio “eu” é o único que pode realizar a verdadeira transformação.

Não há mais espaço nas empresas actuais para a gestão por imposição, sem levar em conta as ideias e a satisfação dos empregados. As consequências vão ainda além da desmotivação e da consequente queda de produtividade.

E também não é possível ao verdadeiro líder ser reconhecido como tal e conduzir pessoas numa determinada direcção, se ele mesmo não estiver a viver a sua própria verdade.

É preciso que os nossos líderes experientes, os nossos novos líderes e as organizações actuais estejam dispostos a conhecer e a trilhar os seus verdadeiros caminhos.

Será que estão?

As consequências de estarem e de não estarem serão experimentadas igualmente por todos eles.

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